“Velho é trapo!”

Por Sandra Regina Schewinsky

Quando eu era criança uma amiga de minha mãe tomava café da tarde lá em casa todos os dias. Era a Dona Ângela, uma italiana com mais de 70 anos, animada e amorosa. Tínhamos um ritual, eu abria a porta e dizia: “Oi véia!”.E ela sempre respondia: “Velho é trapo!”. E eu replicava: “Oi trapo!”.

Ríamos muito da singela brincadeira, que de forma alguma significava uma afronta ou desrespeito.

Agora, mais de cinquenta anos depois, como estamos em relação ao nosso envelhecimento? Levamos o envelhecer com bom humor?

O número de idosos subiu em 57,4% em doze anos, o que significa melhora de qualidade de vida em vários aspectos, mas… nem tudo são flores.

Atuo como psicóloga e neuropsicóloga e vejo uma grande dificuldade de as pessoas com mais de sessenta anos aceitarem tranquilamente a arte do embranquecimento! O número de procedimentos estéticos no Brasil cresceu 390% e, alguns podem colocar a saúde da pessoa em risco.

Ao dar um “Google” na palavra “velho”: “passado, ultrapassado, gasto, superado”. Já a definição de “idoso”, de acordo com a lei, “é considerada pessoa idosa o cidadão com idade igual ou superior a 60 anos”. Entre os direitos garantidos, por exemplo, estão a gratuidade de medicamentos e transporte público – além de medidas que visam a proteger e dar prioridades às pessoas idosas.

Qual a diferença entre jovem e jovial? “Jovem: aquele que tem pouca idade, que ainda não alcançou todo o seu desenvolvimento”. Enquanto “jovial” é que tem e manifesta alegria; que gosta de divertir-se; alegre, contente e leve.

Impossível querer parar o tempo, perigoso não reconhecer as mudanças no corpo e os cuidados que ele requer.

Baixa autoestima, doenças, negação da idade, aposentadoria, queda financeira e isolamento são armadilhas cruéis.

Os idosos são considerados o grupo populacional de maior risco para o suicídio em todo o mundo. Apesar disso, esse fenômeno ainda recebe pouca atenção das autoridades da área de saúde pública, de pesquisadores e da mídia.

Temos o massacre midiático em relação a beleza e juventude que escraviza e traz vazio interior. A maior causa do suicídio é a depressão não tratada, que pode ser causada por perdas, lutos, dores, não querer depender, o medo de atrapalhar os outros e sensação de que se perdeu na vida.

Na minha opinião envelhecer bem não é necessariamente manter a beleza do corpo, mas sim da alma, que pode ser alimentada pelos vínculos afetivos, por investimento na qualidade dos relacionamentos, pelos amigos, sinceridade com os familiares e principalmente pela disposição de ser sempre jovial no sentido lato do termo.

Porque senão, como diria a Dona Ângela: Velho é trapo mesmo!

Sandra Regina Schewinsky é psicológa pelo PUC-SP, mestre em psicologia do desenvolvimento pela Universidade São Marcos, doutora em psicologia social pela PUC-SP, especialista em psicologia hospitalar pelo CFP. Trabalhou como psicóloga no Hospital das Clínicas de São Paulo de 1988 a 2022 e como neuropsicóloga no Hospital Sírio Libanês desde 2008. É professora em vários cursos e escritora. @schewinskysandraregina.

Crédito da imagem: Pixabay.

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