“Eu vim para que tenham vida, e a tenham plenamente.” (João 10.10)
Por Jorge Cruz

Ter uma boa saúde é o desejo de praticamente todas as pessoas, seja qual for o local onde vivem, a sua língua ou cultura. Em 1948, a Organização Mundial de Saúde (OMS) apresentou um conceito de saúde como sendo o “estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não só a ausência de doença ou enfermidade”. Esta definição tem a virtude de reconhecer que não basta o corpo estar bem para se ter saúde. Há outras dimensões que devem ser consideradas, entre as quais a dimensão mental e a social. Contudo, a definição de saúde da OMS parece-me irrealista e mesmo ingênua, pois não é de esperar que cada pessoa esteja a maior parte do tempo neste estado de completo bem-estar físico, mental e social, que mais se assemelha a um estado de êxtase ou de felicidade absoluta. Além disso, há situações em que a pessoa tem uma doença e pode não ter nenhum sinal ou sintoma, como acontece geralmente na hipertensão arterial e em estados iniciais de câncer.
Galeno, um famoso médico grego do século 2 da era cristã, apresentou uma definição de saúde bastante realista e equilibrada. Galeno considera a saúde o “estado em que nos sentimos capazes de fazer as coisas que desejamos fazer, com o mínimo de dor e desconforto”. É uma espécie de meio termo entre a doença incapacitante e uma saúde perfeita de difícil alcance. Nesse sentido, uma pessoa pode considerar-se saudável apesar de alguns condicionalismos de natureza física ou mental, desde que não a impeçam de realizar os seus projetos de vida.
Em 1984, na 37.ª Assembleia-Geral da OMS, foi aprovada a inclusão da dimensão espiritual na definição de saúde desta organização, embora não tenha sido adotada nos documentos oficiais de forma generalizada.
O que a Bíblia diz?
A Palavra de Deus revela o enorme valor da vida humana aos olhos do Criador, desde a concepção até à morte natural (Gn 1.27, Êx 20.13, Sl 139). Encontramos também nas Escrituras Sagradas algumas recomendações para promover a saúde física, mental e espiritual das pessoas.
O conceito hebraico de saúde (shalom) é mais dinâmico e abrangente que a definição da OMS, pois não só considera o ser humano uma entidade biopsicossocial e espiritual, como inclui a noção de plenitude, felicidade, prazer, paz e bem-estar, numa vertente pessoal e comunitária.
Na perspetiva bíblica, a dimensão espiritual é a base de todas as outras, não sendo possível haver saúde integral sem um relacionamento saudável com Deus e com o próximo. Além disso, este estado de saúde (shalom) só será totalmente desfrutado quando o Reino de Deus for finalmente estabelecido para sempre (cf. Fp 3.21, Ap 21.4).
A doença não faz parte dos planos originais do Criador, mas foi uma consequência da desobediência do homem e da mulher no Jardim do Éden (Gênesis 1-3). Parece teologicamente correto afirmar que as doenças estão direta ou indiretamente relacionadas com a atividade do diabo e das hostes demoníacas (cf. Jó 1-2). Como resultado da expulsão do Paraíso, a doença passou a fazer parte da condição humana. O ministério da redenção do Senhor Jesus Cristo também contempla a cura e libertação da doença e de todas as amarras dos poderes das trevas (Lc 4.18-19).
Paulo recorda aos coríntios, e a cada um dos crentes, que o nosso corpo físico, embora temporário, é onde o Espírito Santo habita, e por conseguinte, somos responsáveis perante Deus pelo modo como cuidamos dele. Diz o apóstolo: “Não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus” (1Co 6.19-20).
Uma forma de se promover a saúde, e uma das primeiras a ser estabelecidas por Deus, é a necessidade de descansarmos, não apenas durante o sono mas também um dia por semana: “Lembra-te do dia do sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás, e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor teu Deus; não farás nenhuma obra…” (Êx 20.8-10).
Há também inúmeras advertências na Palavra de Deus acerca dos malefícios do consumo de bebidas alcoólicas, como p. ex. Provérbios 23.29-33.
A moderação e autodomínio são virtudes cristãs (cf. Gl 5.22, Fp 3.18-19) que podem ser aplicadas à forma equilibrada como nos devemos alimentar e a todas as áreas da vida. Lemos em Provérbios 25.16: “Achaste mel? Come o que te basta; para que, porventura, não te fartes dele, e o venhas a vomitar”.
Uma atitude de gratidão e contentamento por todas as dádivas que recebemos de Deus (cf. 1Ts 5.18), e a entrega dos problemas e preocupações ao Senhor, em oração, são outras maneiras de desenvolvermos a nossa saúde mental e emocional, e combatermos o estresse. Paulo exortou os Filipenses: “Não estejais inquietos por coisa alguma, antes, as vossas petições sejam em tudo conhecidas, diante de Deus, pela oração e súplicas, com ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus” (Fp 4.6-7).
Evidências científicas
Contrariamente ao que defendia Freud, que a religião era a causa de neuroses e outras perturbações mentais, é hoje reconhecido o papel altamente positivo da fé para a saúde das pessoas.
O Dr. Harold Koenig, psiquiatra americano, na sua obra autobiográfica The Healing Connection, relata como experimentou a cura de problemas mentais de que padecia desde a adolescência, a partir do momento em que entregou a sua vida a Jesus (p.87). É atualmente um dos principais pesquisadores, a nível mundial, sobre os efeitos da fé e prática religiosas na saúde física e mental, sendo autor e coautor de mais de 35 livros e de centenas de artigos científicos sobre o assunto.
As evidências científicas dos benefícios para a saúde das crenças religiosas, com destaque para a fé cristã, são avassaladoras. Incluem redução da incidência de ansiedade e depressão, consciência do sentido da vida, recuperação mais rápida de estados depressivos e outros problemas de saúde, menor consumo de álcool, tabaco e outras substâncias nocivas, sistema imunitário mais robusto, menor incidência de hipertensão arterial, menores taxas de suicídio, e uma atitude de maior otimismo e esperança em relação ao futuro. Há igualmente uma correlação estatisticamente significativa entre o grau de envolvimento religioso e a mortalidade em geral. As pessoas mais envolvidas nas suas comunidades de fé vivem mais tempo que as que têm uma postura mais passiva e menos participativa na sua igreja local. Um estudo realizado entre afro-americanos revelou que os que participavam nas atividades religiosas mais do que uma vez por semana tinham uma esperança de vida 14 anos superior aos que não frequentavam a igreja (Koenig, p. 133).
O principal problema encontrado entre os cristãos, que se repercute negativamente na saúde, é o excesso de peso, para o que poderá contribuir a participação regular em eventos sociais nas igrejas, envolvendo alimentos ricos em açúcar e gordura e altamente calóricos.
Como melhorar a saúde?
As doenças cardiovasculares e oncológicas, as duas principais causas de morte no mundo, são influenciadas por fatores de risco comportamentais relacionados com o estilo de vida. Cerca de 20% dos vários tipos de câncer estão relacionados com o consumo de tabaco, 10% com o excesso de peso e 8% com o consumo de bebidas alcoólicas. Algumas formas de prevenir estas doenças são uma alimentação saudável, controlar o peso e a tensão arterial, praticar exercício físico, ter bons hábitos de sono, evitar o consumo de álcool, não consumir tabaco, evitar comportamentos de risco (p. ex. na circulação rodoviária) e fazer periodicamente exames de rastreio sob supervisão médica.
A obesidade, considerada uma epidemia dos tempos modernos, é infelizmente cada vez mais frequente entre os cristãos. Alguns dos problemas de saúde relacionados com o excesso de peso são a hipertensão arterial, a doença coronária, o acidente vascular cerebral, a diabetes tipo 2, vários tipos de câncer, lesões osteoarticulares, infertilidade, asma, depressão, doenças renais e hepáticas, e a apneia do sono.
Pequenas mudanças na forma como nos alimentamos poderão fazer uma grande diferença no controle do excesso de peso e na melhoria do estado de saúde. Algumas das mais importantes incluem: fazer uma alimentação variada, aumentar o consumo de vegetais, reduzir o consumo de hidratos de carbono e açúcar, evitar o consumo de alimentos ultraprocessados (refrigerantes, biscoitos, salsichas, etc.), e incluir alimentos fermentados na dieta (kefir, kombucha, etc.). Para quem não é diabético e não tem outras doenças que o impeçam, é aconselhável fazer uma pausa alimentar diária de 12-14h, incluindo o período de sono noturno.
Conclusão
Todos os cristãos nascidos de novo podem estar seguros de que receberão novos corpos quando o Senhor Jesus voltar (1Co 15.40-44), adequados para viverem na Sua presença nos novos céus e nova terra. Mas enquanto vivermos neste mundo, para podermos cumprir cabalmente o nosso chamado e missão, somos responsáveis pela nossas ações, nomeadamente pela forma como cuidamos (ou não) da nossa saúde.
O plano de Deus para cada um dos Seus filhos é que tenham uma vida plena e abundante (Jo 10.10), neste mundo e na eternidade, que se traduz numa boa saúde e bem-estar, a nível físico, mental, social e espiritual. As recomendações milenares que encontramos na Palavra de Deus continuam a ser relevantes para desfrutarmos de boa saúde, na nossa sociedade moderna, tal como têm sido ao longo da história da humanidade. E, como seria de esperar, têm sido corroboradas por inúmeros estudos científicos.
Jorge Cruz é médico especialista em angiologia e cirurgia vascular, doutor em bioética, membro do Comitê de Países de Língua Portuguesa da International Christian Medical & Dental Association (ICMDA), membro honorário da Associação Cristã Evangélica de Profissionais de Saúde (ACEPS-Portugal), membro do Conselho Internacional da PRIME – Partnerships in International Medical Education. Mora em Porto, Portugal.
Bibliografia
Bunn, A. & Randall, D. (2011). Health benefits of Christian faith. CMF Files 44. Christian Medical Fellowship. https://www.cmf.org.uk/resources/publications/content/?context=article&id=25627
Fergusson, A. (1993). Health: The strength to be human. Inter-Varsity Press.
Koenig, H. G. & Lewis, G (2000). The Healing Connection: The story of a physician’s search for link between faith and science. Templeton Foundation Press.
Saunders, P. (2014). The Human Journey: Thinking biblically about health. Christian Medical Fellowship.
Imagem: Unsplash.
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